quarta-feira, 1 de abril de 2009

Corações partidos

Algumas mágoas jamais cicatrizam.

Eram quase crianças. Ela nunca tinha namorado de verdade com ninguém.
Eles andavam pela rua de mãos dadas e conversavam banalidades quando ela começou a sentir aquele calor lhe dominar o coração. A alegria infinita de ter alguém bacana a seu lado, de ter uma mão apertando seus dedos, de ter uma boca beijando seus lábios entre uma frase e outra, de poder rir juntos, de poder viver pequenos momentos lindos como aquele.
A felicidade era tão grande que ela sentiu vontade de dizer algo. Tinha medo, mas a vontade era maior que tudo e, justamente pra não deixar o medo sobrepujar a vontade ela disse rapidinho: "Eu amo você!"
Ele ficou silencioso de repente. Ficou sério. Ela se arrependeu imediatamente e a alegria deu lugar ao pânico.
Ele encostou os dedos nos lábios dela: "Não diga isso."


Ela tinha ficado grávida aos 15 anos. Besteira de adolescentes. Acabaram casando-se.
Assim que ele terminou a escola, conseguiu um emprego num cargo público em outra cidade.
Ela ficou ali mesmo porque era o melhor lugar pra criar o bebê. Porém, mesmo que ele aparecesse todo final de semana, a saudade que ela sentia não se dissipava. Pelo contrário. Parecia crescer mais e mais a cada sábado e domingo que não eram suficientes pra sanar a carência que sentia pelo pai de sua filha.
Um dia ela resolveu fazer uma surpresa. Comprou um corpete de renda preto com detalhes bordados, uma cinta-liga e meia calça.
À noite depois do banho, perfumou-se, passou cremes, vestiu a meia, a cinta-liga, o corpete e foi seduzir seu amor que lia uma revista qualquer na cama.
Ele olhou pra ela, abriu um sorriso e disse: "Que é isso, vai desfilar Carnaval?"


Eles estavam casados há alguns anos. Já tinham enfrentado e superado várias crises. A mais recente porém, estava difícil de superar. Numa noite, enquanto ele assistia TV no sofá da sala ela sentia seu corpo vazio de propósito, de carinho, de razão de ser. Tomou coragem, tentou esquecer todas as mágoas e aninhou-se no corpo dele, dando-lhe um beijinho no pescoço e no lóbulo da orelha.
Ele olhou pra ela e não disse nada, mas antes tivesse dito. Seu olhar tinha um asco que fê-la sentir-se o ser humano mais repugnante da face da terra. Algumas mágoas jamais cicatrizam.

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