sábado, 11 de outubro de 2014

Diálogo 10

Deitados na cama, bêbados, quase nus:
_Vira meu namorado?
_Como assim?
_Me pede em namoro, senão não deixo você tirar a calcinha!
_Quer namorar comigo?
_Quero.

E foi-se a calcinha.

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Dois caras

E então, num final de semana, calhou de um cara conhecer e se apaixonar profundamente por duas meninas totalmente diferentes entre si.

Uma das meninas era sulista, tinha nascido numa cidadezinha fria, quase dentro da Argentina. Tinha os cabelos vermelhos, olhos verdes reluzentes, a pele coalhada de pintinhas e a boca em formato de coração.
Era romântica mas tinha uma postura reservada e pragmática. Quando foi embora, deixou na mesa dele um bilhete com seu email pessoal porque achou que seria invasiva demais se deixasse o número do telefone.
De certa forma o cara sentia que ela lhe fazia lembrar de sua primeira esposa, mas de um jeito bacana.
Quando acordaram ela pediu pra ele colocar Madonna na vitrola.
Comeram omeletes no café da manhã e passaram o dia todo nus, na cama, conversando sobre arte, sobre misticismo, filosofia celta, feminismo e bordado.
Ela falou sobre quanto admirava seus pais e sobre como era morar em São Paulo. Falou sobre o emprego e sobre a gatinha com quem dividia apartamento, um bichano com um nome tão bobo e pueril que o cara sentiu ternura imediata.
Eles tentaram se encontrar outras vezes, mas os compromissos não coincidiam e os horários livres também não.
Finalmente almoçaram, um domingo, na Liberdade e foram pra casa dela. Não rolou.
Ela estava afim e ele estava afim, mas foi meio tosco, meio cômico, bastante constrangedor. E a oportunidade que ele esperava de encontra-la de novo, de mudar a imagem, de sanar os equívocos, nunca veio. Ela adoeceu e ligou insinuando que queria os cuidados dele. O cara não teve como ir e acabou nunca indo.
Ela achou que ele era um babaca. Bonitinho, articulado, mas babaca. Achou que ele era gay ou imaturo ou romântico demais. Demais, de um jeito que não rola.

A outra menina era morena de cabelos cacheados e irrefreáveis. Tinha vindo de Recife e falava muito e muito bem, com uma vozinha fina, meiga e doce, de sotaque sutil e um “R” que quase sumia no meio das palavras.
Tinhas tatuagens imensas pelas costas,  a pele corada, olhos cor de âmbar e uma coleção de Daddy Issues.
A principio ela pensou que o cara fosse gay. Era muito bem vestido pra não ser gay.
Eles beberam. Beberam muito, até quase o dia nascer.  Ela disse logo que tinha gostado dele. Falaram sobre a infância, sobre família, sobre livros, sobre filhos, sobre fetiche, horóscopo, tatuagem, depressão e só depois – bem depois – atracaram-se, furiosamente, no sofá.
Trocaram fotos nus pela internet e viraram noites conversando e se pegando, bebendo, fumando e se pegando de novo.
Olhando pra ela, o cara se lembrava um pouco de casa, do povo de sua terra, das meninas por quem tinha sido apaixonado na infância.
Comeram sanduíche de prosciutto, risoto apimentado de camarão e – no fim – foram cada um pra um canto. Querendo estar juntos.

Ela achou que ele seria seu protetor, um porto seguro, um peito são sobre o qual repousar. No fim, concluiu que ele era um babaca. Hetero, viril, pragmático, mas calculista demais. Demais de um jeito que não rola.