sexta-feira, 29 de maio de 2009

Efémero

Quando eu era criança, bem criança e vivia num sítio, passava as tardes brincando sozinho, nadando no córrego, explorando as grutas e apagando as queimadas que os fazendeiros faziam nos sítios vizinhos, uma vez uma borboleta encanou de me seguir.
Pra onde quer que eu fosse ela vinha atrás, pousava no meu ombro, voava ao redor da minha cabeça e eu me apaixonei.

À medida em que o dia passava fui sendo tomado por um pavor terrível por saber que borboleta não serve como animal de estimação e que, quando a noite chegasse ela iria fazer o que quer que seja que as borboletas façam quando anoitece e certamente me abandonaria.
O amor tem dessas coisas. Às vezes a gente está careca de saber que aquilo não tem como dar certo, que vai acabar e vai acabar mal. A gente sabe que mais cedo ou mais tarde vai perder aquela companhia porque, afinal de contas, aquilo não é nosso, não é pra ser nosso e que vai ser abandonado, vai ficar na merda, sozinho e sem consolo. A gente sabe que vai sobrar só a saudade e finge que mais importante do que ter, é ter a lembrança de ter tido. De ter vivido aqueles momentos efémeros e ser grato pela bênção de ter podido vivenciar isso.
A gente sabe. Mas mesmo assim toca adiante. Se envolve, se deixa levar, ama, se dôa. Mesmo assim a gente investe. Aposta na causa perdida, sonha e romantiza que pode haver uma solução, um milagre qualquer que vá evitar a perda.

Quando eu me apaixonei por aquela garota que tinha uma filha eu sabia que a filha não era minha, que nunca ia ser mesmo que eu tivesse assumido pra mim a responsabilidade de ajudar a cuidar dela. Eu sabia que cedo ou tarde, por mais que eu a amasse e ela a mim, aquilo não tinha futuro. Mesmo que eu torcesse pra que o verdadeiro pai dela sumisse ou morresse ela ia continuar sendo filha dele e não minha. Mesmo que todo mundo fosse extremamente relapso com relação a ela, minha atenção e cuidado, meu zelo não faria ela me ver como um pai.

Hoje, enquanto eu organizava meus livros descobri entre as páginas uma foto que ela certamente escondeu pra que um dia eu encontrasse. É uma foto daquelas com roupinhas dos anos 20 que os fotógrafos vão vender nos jardins de infância. No verso, com canetinha azul, estava escrito naquela letrinha tosca e pueril: "Perini, eu te amo. Ass: julia"

5 comentários:

Pati disse...

Gracinha de post, gracinha mesmo. E o blog é todo bom tb :)

E foi bom? disse...

Cara, li uns textos seus e pensei exatamente no q eu pensei quando fiz o blog.

"Eu não sou um monstro, nunca fui e pretendo defender a minha idéia escrota d amor. O nome não pode soar forte e nem estereotipar dmais, agente vai falar tudo e bom q, parte disso, faça alguêm refletir"

Eu tava lendo e muita coisa do q vc escreveu possui um som muito mais literário, mágico, sonhador... coisas do tipo. Tentei separar oq poderia ser fato da ficção e (mesmo crendo q não existia ficção) não achei.

Eu to dizendo isso pra fundamentar q, na minha opinião, Escola de Canalhas soa muito forte. Ou vc eh um cara muito ruim e fode todo mundo mesmo, eu q to sendo inocente ou vc tem raiva do q faz e deixa acontecer, mesmo fzdo mais mal pra vc do q pros outros. Qrendo se chamar d canalha, por não se conformar com muita coisa.

Valeu e desculpa a biblia :)

Adonay Esteves disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
JAIRCLOPES disse...

Cara, você é um escritor com todas as características que fazem um grande escritor. Tem sensibilidade, não agride o vernáculo, dá o recado com clareza e suas histórias tem conteúdo, trazem um carga emocional presente que dificilmente o leitor não se envolve. Parabéns.

JAIRCLOPES disse...

Caro Thi, gostaria que você desse permissão para eu usar um trecho deste texto em post que pretendo escrever sobre borboletas. Abraços, JAIR.