sexta-feira, 2 de março de 2012

Fidelidade / Lealdade



Em toda mesa de bar, programa de televisão, roda de amigos ou matéria de revista que em algum momento se proponha a discutir questões referentes ao comportamento humano e, principalmente, relacionamento humano, acaba-se eventualmente tocando na questão da fidelidade conjugal.
A maioria das opiniões concorda no principal: que fidelidade é importante.
Outras opiniões divergem e se bifurcam, caminham em paralelo e muita coisa acaba ficando sem resposta.

Das questões não respondidas, uma em particular sempre me encafifou mais. É que, não raro nesses bate-papos acaba-se correlacionando fidelidade com lealdade e dando-se valores e pesos diferentes pra cada conceito.
Os defensores da monogamia costumam apoiar que uma é indissociável da outra. Mas se enrolam ao tentar definir a segunda.
Os polígamos defendem que mais importante que a fidelidade conjugal propriamente dita é a lealdade. Mas não conseguem também explicar como isso funciona de forma prática.

Fidelidade conjugal é muito fácil de se definir: duas pessoas se relacionam amorosamente e estipulam um contrato (explícito ou implícito) que estabelece os limites da relação. Esses limites normalmente estão vinculados à noções pessoais de moral, liberdade individual e conveniências sociais. Quando alguém descumpre os termos do contrato (consciente ou inconscientemente), isso é chamado de infidelidade.

Sem precisar recorrer ao clichê de transcrever a definição do dicionário para "lealdade", é relativamente fácil compreendê-la como sendo o compromisso de uma pessoa de resguardar os limites morais e sentimentais da pessoa com quem ela se relaciona. E pensando nisso, lembrei de uma história que - se não define - pelo menos explica o que acabei de dizer.

Quando eu era casado minha mulher tinha uma amiga dos tempos de escola que freqüentava vez ou outra nossa casa. Ela era casada desde o colegial e tinha uma filha.
A cada visita as mulheres se sentavam e ficavam horas conversando sobre o cotidiano, os problemas familiares e seus relacionamentos. Normalmente eu estava no meu estúdio e escutava uma coisa ou outra.

Porém, certa vez fiquei com elas e participei das conversas. Nessa ocasião a amiga deslanchou a falar sobre o marido, reclamando de certas posturas e certas atitudes dele. Coisas relacionadas ao casamento dos dois e à intimidade conjugal.
Eu entendia que minha mulher e a amiga eram bastante próximas e partilhavam confidências, mas me incomodei pela outra estar expondo detalhes (e principalmente defeitos) acerca do marido que, na minha opinião eram intrínsecos à relação dos dois e só deveria dizer respeito a eles.
Me senti ofendido ao imaginar que minha esposa também pudesse abrir pra terceiros questões que eram nossas e só nossas.  Que pusesse a público, intimidades e detalhes inerentes à nós dois, deixando que pessoas de fora, com entendimento parcial da nossa dinâmica juntos, pudessem ter opiniões potencialmente equivocadas, além de sentirem-se no direito de interferir na relação em qualquer âmbito que fosse.

E foi então que realizei a questão toda. A amiga da minha esposa sentia-se à vontade pra expor fatos de sua relação a terceiros e a listar opiniões sobre seu marido que - muito provavelmente - não expunha ao próprio marido. Ela abria pra sua melhor amiga, definições, opiniões e conceitos que escondia da pessoa a quem tinha escolhido pra compartilhar a vida e construir uma família. Com isso, permitia que outras pessoas acabassem por formular opiniões e julgamentos sobre seu cônjuge, que ele mesmo ignorasse, tirando-lhe não só o direito de se defender, como a possibilidade de se remediar.
Ela até podia ser fiel ao marido e nunca tê-lo traído conjugalmente. Mas com toda certeza, agindo assim, não lhe era leal.


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