sábado, 29 de junho de 2013

Duas ou três semanas

Se eu dissesse que eu não sinto falta dela, estaria mentindo. Se eu dissesse que, às vezes, deitado na cama, prestes a dormir, quando de repente a ilusão de seu cheiro surge na minha mente, mesmo que ela não tenha - nunca mais - posto os pés dentro de casa e me vem à cabeça a lembrança viva de suas perninhas finas apoiadas nas minhas ao longo da noite, eu não lamento profundamente o rumo que as coisas tomaram, eu estaria me enganando.
Se eu dissesse, enfim, que nunca torci pra que aquilo desse certo, mesmo com todas as chances de que desse catastroficamente errado eu estaria sendo absolutamente desonesto.
Se eu dissesse que, cada vez que vejo uma de suas fotos, sorrindo lindamente em meio aos amigos, resplandecendo com aquelas caras e bocas, aquelas expressões absolutamente sicilianas... se eu dissesse que não me comovo, eu estaria sendo estúpido.
Mas a vida tem seus próprios caminhos, seus meios canhestros de construir histórias, suas estradas tortuosas, sua forma peculiar de traçar os destinos e aquela foi só mais uma estranha, bela e rápida história de amor.


 Se eu dissesse que aquelas duas ou três semanas não ficarão pra sempre marcadas em mim, pro bem e pro mal, eu estaria enganado.

terça-feira, 18 de junho de 2013

Do Egoísmo

Depois do desmoronamento sentimental que me provocou o fim de mais uma relação longa, fiz o que a maioria das pessoas fazem e corri atrás de alguém que pudesse tomar o lugar da guria que tinha ido embora. Foi um desastre, lógico. Sempre é.
Com o tempo o obvio aconteceu e aquela necessidade quase desesperada de substituição foi se esmaecendo natural e gradualmente. Outras pessoas vieram e ocuparam o lugarzinho que estava vago mas, dessa vez, não pra substituir alguém e sim por méritos próprios. Porque eram pessoas interessantes em algum nível, porque eram bonitas, porque me atraíam a curiosidade, porque me agradava a companhia ou porque tinham um excelente desempenho sexual.
Uma nódoa ficou, no entanto, e meu criticismo (muito provavelmente afiado depois das desilusões) chegou num patamar em que simplesmente não consigo mais olhar pras pessoas sem desgostar delas em algum nível.
É como naquele filme antigo em que o mocinho de repente olha pras pessoas e pras coisas na rua e enxerga o que existe por trás dos rostos bonitos, das boas intenções, dos outdoors insuspeitos.
De repente todas as pessoas tornaram-se sinistramente transparentes e toda a fraqueza, o egoísmo, toda motivação dúbia ficou clara o suficiente a ponto de anular qualquer ímpeto de me aprofundar nelas. É como se acabasse o mistério, como se tivesse se esgotado a minha curiosidade, o meu fascínio e tudo tivesse ganhado o tom cinza do tédio. Aquela cor dessaturada e desinteressante do clichê.

Talvez isso seja só uma fase. Talvez isso dissolva-se e desapareça sozinho e de forma tão natural quanto apareceu. Ou talvez não.
O fato é que, agora, tudo é tão chato, tão desprovido de ânimo que me falta motivos até pra lamentar. Minhas ideologias, minha moral, minhas crenças, minhas certezas ocupam tanto espaço que não me sobra tempo nem intelecto (nem sentimento) pra mais nada que não seja eu mesmo ou minhas aspirações.
Deixa estar, então.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

Casal Bonito

Ela disse “Vocês formam um casal bonito” e eu não fui capaz de agradecer.
A mesma frase já tinha sido dita tantas vezes, em tantas situações diferentes, em tantos relacionamentos anteriores àquele que a coisa toda acabou perdendo o peso e o possível conteúdo lisonjeiro tinha se esvaziado.
As pessoas sempre dizem esse tipo de coisa com a intenção de serem simpáticas e quem ouve recebe como se fosse uma saudação, uma constatação externa de aprovação, um atestado do potencial de sucesso que aquela relação encerra. Mas quando tudo termina, quando o belo casal se desfaz e a harmonia se quebra a audiência escolhe um lado. Um dos membros do casal é eleito como a vítima, o outro como algoz e as exclamações elogiosas dão lugar a conselhos e frases de consolo maliciosas.
Aqueles que pareciam apoiadores do projeto amoroso dos dois, tornam-se testemunhas receosas do fracasso, balaústres da dor do lado aparentemente derrotado.
Quando o amor se finda os elogiosos expõem antigas desconfianças e receios anteriormente velados por “respeito” ou por “educação”.
Quando o belo casal rompe todos os demais tinham tido pressentimentos negativos. Todos os externos tinham deduzido que aquilo daria em nada.


Escola

Muito frequentemente as pessoas me perguntam o que inspirou o nome do blog. Mais frequentemente ainda as pessoas – principalmente as garotas – deduzem que o “Canalha” do título seria eu.

Nunca foi.

O blog se chama “Escola de Canalhas” porque a vida é uma escola de canalhas. Porque as mulheres, os amores perdidos, as desilusões e as dores de cotovelo são a Escola de Canalhas de qualquer cara.

Ninguém nasce canalha e, na verdade, salvo raras exceções todo mundo nasce bobo e bem-intencionado.

Não há nem nunca houve qualquer intento doloso naquele bilhetinho galante com caligrafia tosca pousando repentinamente na mesa da coleguinha da segunda série.
Nenhuma idéia maligna motivando a declaração de amor boba sussurrada timidamente entre dezenas de reticências, olhares vacilantes e testas úmidas, no intervalo entre as aulas de matemática e de história.
Nem um lampejo de maldade por trás daquele pedido de namoro.
Não há sentimentos escusos, nenhuma vilania ou qualquer mesquinhez no desejo de dar e receber carinho. Não há segundas intenções na ânsia de estar dentro do corpo da menina, de sugar-lhe a língua, de embrenhar-se nos cabelos dela.
Quando aquela necessidade quase inebriante de tê-la por perto, de ouvi-la falar, de monopolizá-la toma conta de tudo, não há motivações egoístas.
Nenhum desejo deliberado de subjugação.

Tampouco há qualquer vício ou cólera por trás daquele pedido de casamento.

No entanto o bilhete tosco é rechaçado. A declaração de amor é ignorada e o pedido de namoro, negado.
Apesar de todas as boas intenções, de toda motivação amorosa o sexo é tomado por pecado e a ânsia por companhia tida como restrição.
Em detrimento das motivações nobres, das ambições cálidas o pedido de casamento vira ameaça.
E não por maldade, mas por inépcia, com o tempo o que parecia bom vai ficando cinza e ganhando ares de crueldade. E por medo e por despreparo toda calidez vira raiva, desprezo e frieza.
E por uma sequência de fatalidades a vida acaba, enfim, por graduar mais um canalha.